Prisão preventiva ou prisão midiática
Quando nos vemos diante de eventos que em que parece estar claro que se trata de crime, quem é o autor, é comum as pessoas se indignarem pelo fato da pessoa que praticou o crime não ficar presa. Quando o crime causa grande abalo social, setores da mídia e cidadãos pedem a prisão imediata do acusado, mesmo sem julgamento. Fala-se que não se deve deixar o criminoso impune, como se a prisão preventiva ou temporária – ambas prisões processuais – tivessem a finalidade de punir aqueles que cometem um delito.
É inegável que a prisão traz a ideia de punição. Só se deve prender quem comete um crime. Partindo dos mesmos pressupostos chega-se à conclusão que não se deve prender aquele que não cometeu crime algum.
Mas como chegamos à conclusão que uma pessoa é culpada? Que o crime efetivamente ocorreu e que foi aquela pessoa que o praticou? Somente é possível chegar a essa conclusão a partir de investigações e do julgamento, com a acusação e a defesa mostrando seus argumentos. Em outras palavras, o acusado só deve ser preso após ser julgado, tendo em vista que a Constituição diz que a pessoa só pode ser presa após não haver mais recursos para questionar a decisão que o condena.
Isso não quer dizer que a pessoa não possa ser presa no curso da investigação ou do processo, mas a prisão de quem ainda não foi julgado não pode ser a antecipação da pena, afinal todos são inocentes até a condenação.
A prisão no curso das investigações, uma vez que não se deve antecipar a pena, pode se dar nas hipóteses de o acusado tentar fugir para não ser preso no caso de ser condenado, por estar atrapalhando o andamento das investigações ou do processo (ex. destruição de documentos ou ameaça a testemunhas) ou por risco à ordem pública e econômica.
Os dois primeiros casos são claros. Mas o que seria ao certo garantia da ordem pública e econômica? Hoje se entende que a pessoa que apresenta risco à ordem púbica e econômica é aquela que pode voltar a cometer crimes caso fique em liberdade.
Há algum tempo se discutia se o clamor público poderia servir de base para uma prisão preventiva, sob o argumento de que o Poder Judiciário ficaria desacreditado se mantivesse o acusado em liberdade. Esse argumento já foi superado há algum tempo, pois não é porque uma pessoa aguarda o julgamento em liberdade que todo o sistema judiciário ficará desacreditado. Muito pelo contrário, o descrédito no sistema judiciário se dá quando as leis não são cumpridas, e antecipar a pena para atender o clamor público seria desrespeitar a Constituição, a lei máxima de Qualquer Estado de Direito.
Importante lembrar, ainda, que a decisão que prende preventivamente uma pessoa deve sempre ser fundamentada e estar baseada em fatos reais, nunca em suposições ou conjecturas. Ou seja, não basta dizer que o acusado pode fugir a qualquer momento, deve-se mostrar que ele tem mostrado predisposição para a fuga por conta de suas atitudes (ex. compra de passagem só de ida para outro país).
Ponto que merece especial importância é que a opinião pública nem sempre é baseada na realidade. A história do crime pode estar sendo mostrada de forma parcial pela mídia, afinal mostra-se a versão que é mais vendável; o flagrante pode ter sido forjado; a vítima pode ter se enganado ou mesmo mentido com o intuito de prejudicar o acusado. Todas essas questões podem e devem ser levadas em consideração no processo. O juiz, com todas as provas e argumentos em mãos, deve decidir se a pessoa deve ou não ser condenada.
Antecipar a pena pela pessoa ter sido presa em flagrante, com base no depoimento de uma testemunha, ou por pressão popular é contrário à Democracia, por isso o objetivo da prisão processual não é a punição do acusado, mas garantir que a pessoa, se condenada, será punida; impedir interfira no processo; ou evitar que cometa outros delitos. Toda prisão preventiva que não tenha um desses objetivos será ilegal.
A pessoa só deve perder sua liberdade por atos que ela praticou, nunca por ineficiência do Estado em garantir a própria credibilidade ou por se curvar à opinião das massas.