Como acusação nos EUA pode complicar vida de Del Nero e Teixeira no Brasil
As denúncias formalizadas nos EUA na última quinta-feira (3) contra Marco Polo del Nero e Ricardo Teixeira, presidente licenciado e ex-mandatário da CBF, respectivamente, não têm o poder de levar os dois cartolas a responder imediatamente à Justiça norte-americana pelos crimes de que são acusados: corrupção, formação de quadrilha e enriquecimento ilícito.
Isso não quer dizer, porém, que as investigações nos EUA não possam levar a complicações para a dupla. Mesmo que eles evitem sair do país (como já vem fazendo Del Nero, que, desde a prisão na Suíça do também ex-presidente da CBF, José Maria Marin, no dia 27 de maio, nunca mais colocou os pés fora do Brasil), a denúncia e os desdobramentos dos processos nos EUA contra os cartolas podem complicar a vida dos dois em terras brasileiras.
Veja, abaixo, quais são as consequências possíveis para Teixeira e Del Nero da denúncia criminal que sofrem no exterior.
1 - Bloqueio de bens e ativos
Quando uma investigação sobre determinado crime envolve apropriação indevida ou desvio de recursos ou bens de entes públicos ou privados, é comum que as autoridades acusatórias solicitem à Justiça o bloqueio de contas bancárias ou arrestar bens patrimoniais dos acusados
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"Esses recursos ficam bloqueados, à disposição da Justiça, até que o processo chegue ao fim. Se os acusados forem considerados culpados e condenados a ressarcir os cofres públicos ou o patrimônio de quem eventualmente foi lesado por seus crimes, então pode se utilizar os bens que foram bloqueados", explica o advogado criminalista Bruno Salles Pereira Ribeiro.
Como a investigação nos EUA se debruça sobre práticas criminosas que teriam movimentado ilegalmente mais de R$ 800 milhões, é possível que as autoridades de lá solicitem à Justiça brasileira o bloqueio de bens de Del Nero e Teixeira, no valor que julgarem corresponder aos atos cometidos pelos dois dentro do esquema criminoso que teria sido montado na Fifa. Se isso ocorrer, caberá aos magistrados brasileiros decidir se atendem ou não ao pedido dos norte-americanos.
2 - Processo penal no Brasil
Como os crimes de que são acusados nos EUA também são previstos na legislação brasileira, a investigação norte-americana pode atrair o interesse das autoridades persecutórias nacionais, como a Polícia Federal e o Ministério Público.
Nesse caso, os promotores ou delegados podem solicitar às autoridades norte-americanas o envio de provas e documentos que baseiam a acusação na Justiça dos EUA, para que tenham elementos para montar sua própria ação penal no Brasil, passando a processá-los por aqui.
"A partir daí, abre-se um processo penal comum, que pode levar a todas as consequências previstas em lei, como prisão preventiva, prisão temporária, retenção de passaporte e eventualmente uma sentença condenatória que leve ao cumprimento de pena de prisão", esclarece o advogado Ribeiro.
Por ora, existe uma decisão liminar (provisória) da Justiça do Rio de Janeiro que proíbe a colaboração formal entre as autoridades de investigação dos EUA e do Brasil especialmente para o caso dos crimes eventualmente cometidos na Fifa. O Ministério Público Federal, porém, já entrou com recurso em instância superior para derrubar a decisão. Além disso, nada impede que a colaboração se dê de maneira informal e amistosa entre os promotores dos dois países, sem passar pelas vias formais previstas em lei.
3 - Condenação no Brasil após sentença nos EUA
Se a acusação contra os dois cartolas acabar em condenação transitada em julgado (definitiva), o processo dos EUA pode gerar uma sentença condenatória correspondente aqui no Brasil.
Conforme explica André Lozano Andrade, especialista em direito processual penal do escritório RLMC Advogados, "a sentença norte-americana teria que ser homologada pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça). No processo de homologação, a corte brasileira iria adequar as penas previstas na sentença norte-americana às leis brasileiras, e então executá-la (a sentença) como se tivesse sido proferida por um tribunal do país".
Se isso viesse a ocorrer, os réus (já condenados) não teriam direito a recurso, uma vez que o direito de defesa já teria sido exercido nos tribunais dos EUA. Seria-lhes de direito, porém, manifestarem-se durante o processo de homologação, apontando eventuais falhas no rito de homologação, mas sem discutir se são ou não inocentes nos crimes que lhes seriam imputados.
O advogado ressalta que as condenações que poderiam ser homologadas seriam somente aquelas para ressarcir danos eventualmente causados pelas ações dos réus, mas não incluem prisão. Ou seja, Del Nero e Teixeira não poderiam ser presos no Brasil exclusivamente em virtude de uma sentença norte-americana.